Uma Utopia chamada Opus Dei

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"A maior jogada do Diabo foi convencer o mundo que ele não existe."
Roger "Verbal" Kints, personagem do filme “Os Suspeitos”

Introdução

Há cerca de uma década, o intelectual italiano Rino Cammilleri lançou um interessante livro intitulado “I mostri della Ragione”. Na Espanha, este livro foi editado pela Ediciones Rialp (que é, sem deixar de ser, do Opus Dei), com o título: “Los monstruos de la Razón: Viaje por' los delirios de utopistas y revolucionarios”.

Neste livro, Cammilleri ilustra vários exemplos de utopias ao longo da História, que quando postas em prática transformam-se em verdadeiros monstros da razão. Entre estes exemplos são citados os Incas totalitários, o Reverendo Jim Jones, a Maçonaria, a Sociedade Espartana, o Nazismo, o Marxismo e até os grupos de rock não foram esquecidos.

O autor afirma que nem todas as utopias estão citadas, pois não era “intenção compor uma obra de doze volumes”. Assim coube-nos extrair os mesmos critérios de Cammilleri e checar a aderência de várias de suas considerações sobre as utopias em cima do próprio Opus Dei, do qual o autor é simpatizante, conforme pode ser observado em seu site (ver em links de seu site). A intenção deste texto é mostrar que mesmo uma instituição católica como o Opus Dei está sujeita aos erros provocados pelas utopias.

O problema das utopias

O pensamento utópico é uma constante na História das civilizações, seduzindo as pessoas através de suas boas intenções iniciais, mas que quando postas em prática, tornam-se o extremo oposto dos seus fins. Conforme discutido no estudo da «Sociedade Fechada do Opus Dei e seus “Amiguinhos”», o problema surge quando ocorrem transformações imperceptíveis das mensagens iniciais da Obra em algo totalitário. Esta somatória de sutis distorções do discurso da Obra de mensagens retiradas da Biblia e da tradição católica resultam numa completa inversão do rumo à santidade para os membros numerári@s.

As mensagens da Obra são altamente atraentes para aqueles que se aproximam dos seus meios de formação, propondo um cristanismo revolucionário para os leigos, com frases como: “colocar a Cristo no cume das atividades”, “santificação do trabalho no meio do mundo”, “faz o que deves, está no que fazes” etc.

Já nos ensinavam na Obra que o Inferno está cheio de boas intenções. Assim são as utopias, das quais o Opus Dei também pertence. O livro de Cammilleri contém citações interessantes sobre as boas intenções das utopias, das quais recolhemos duas:

Oscar Wilde: “Sempre ocorre que com as melhores intenções produzem-se as piores obras”.
Von Clausewitz: “Os erros mais perniciosos são precisamente aqueles que resultam de uma boa intenção”.

Um outro crítico dos regimes totalitários foi o Prêmio Nobel de Economia, Friedrich Hayek, que escreu o livro “O Caminho da Servidão”. Neste livro de Hayek, o capítulo 2 chama-se, “A grande utopia”, que se inicia com uma citação bem parecida com as anteriores, que é:

F. Hoelderlin: “O que sempre fez do Estado um verdadeiro inferno foram justamente as tentativas de torná-lo um paraíso.”

De acordo com Cammilleri , um modelo de sociedade utópica é sempre o mesmo: governo absoluto dos “melhores”, igualdade total, dependência do Estado, abolição da propriedade privada e do matrimônio.

Estas características estão presentes na vida de um membro numerári@ do Opus Dei. Dentre estas características iremos destacar aquela presente em todas as utopias e que também exerce um papel significativo na vida de um membro numerári@ da Obra: a abolição da propriedade privada.

Na Obra, um membro numerári@ entrega todo o seu salário ao secretário do centro do Opus Dei onde mora. Na prática isto é feito através da entrega do cartão e o cheque do banco onde recebe o seu salário. Para seus gastos ordinários, o membro numerári@ deve comparecer no dia e horário pré-estabelecidos na sala do secretário do centro para fazer a retirada do dinheiro. Estes gastos ordinários devem ser devidamente anotados na chamada “conta de gastos” e devem ser entregues ao final do mês ao diretor do centro onde mora, de modo a checar eventuais gastos desnecessários.

Nas diversas palestras da Obra, os membros numerári@s são doutrinados a não possuírem bens materiais, tendo na prática como único bens as roupas do corpo. A aquisição de livros por um membro numerári@ é muito burocratizada, o que o leva a não se empenhar muito nesta árdua tarefa. Sempre há uma chantagem emocional para coibir esta prática. Pode-se acusar um membro de estar muito apegado a vida profissional, ou de que não vive a pobreza, pois um família pobre deveria cuidar de assuntos mais urgentes que um mero livro.

Esta crítica da abolição da propriedade privada foi muito utilizada contra o comunismo, socialismo etc. Verifica-se que este mesmo erro encontra-se praticado no meio de uma instituição católica em pleno século XXI, após anos da derrubada do muro de Berlim. Mas, como já diziam os antigos, o homem é fundamentalmente um ser que esquece. Assim, uma outra citação interessante do livrode Cammilleri é :

Carlo Dossi: “A utopia' de um determinado século com' frequência se converte num idéia vulgar par' o século seguinte”.

A entrega de todos os bens de um membro numerári@ para o Opus Dei cria conseqüentemente uma dependência econômica, que favorece ainda mais a permanência deste indivíduo como membro da organização, pois literalmente “não tem onde cair morto”, conforme descrito no depoimento de GP.

Uma outra passagem interessante do livro de Cammilleri refere-se sobre o regime totalitário dos incas, que se parece muito com a vida de um membro numerário, que transcrevemos a seguir:

Por lei, a atividade devia ser incessante: se uma mulher visitava uma vizinha deveria enrolar a lã durante o trajeto. Com freqüência tratava-se de trabalhos absolutamente inúteis; o que se pretendia era que ninguém tivesse um só momento livre.

Em resumo, a vida dos incas estava minuciosamente controlada e homologada, da mesma forma como ocorre com os numerári@s. Várias são as tarefas inúteis dentro da Obra. Podemos citar alguns exemplos na seção masculina, como as famosas (e intermináveis) transcrições de fitas cassetes das tertúlias do Dr.Xavier (2 fitas de 45 minutos por semana, ao longo de anos... trabalho que nunca foi utilizado para nada!!!!), grampear o folheto informativo do Nosso Padre etc.

Caso um membro numerári@ questione o ensinamento de que a Obra é o melhor lugar para se viver e morrer, será tachado de louco. Cammilleri cita uma passagem que se adere a esta colocação, transcrita a seguir:

.... Esta história nos recorda as clínicas psiquiátricas soviéticas, nas quais o dissidente louco era “curado” a força. O silogismo é o mesmo: o socialismo real é a felicidade; se não o crê, é porque está louco.

Na Espanha, a salvação da “loucura” do membros numeri@s é a internação no famoso Quarto Pavimento da Clínica da Universidade de Navarra, empreendimento do Opus Dei.

A situação da mulher num regime totalitário é descrita da seguinte forma por Cammilleri:

Em tudo que foi exposto há um detalhes curioso que seguramente não haverá escapado ao leitor. Todos os utopistas tem falado em igualdade, é certo, mas “entre linhas” adverte-se que esta igualdade refere-se somente aos homens. Algumas vezes as mulheres são declaradas iguais aos homens, porém a comunidade ansiosa as relega ao papel que sempre pensaram para eles. É dizer, que podem ser usadas como objetos.

No Opus Dei, diferente de outros utopias, a mulher não são utilizadas como objeto sexuais. Mas há algumas regras diferentes para as mulheres no Opus Dei. Até os 40 anos as mulheres numerárias dormem em colchões de madeira. Os serviços de limpeza dos centros da obra são realizados pelas numerárias auxiliares, que realizam um trabalho praticamente escravo, bem como não possuem condições para se aperfeiçoar nos estudos. Pode-se enquadrar então a condição das numerárias auxiliares como de objeto de serventia aos interesses da obra.

Palavras finais

Após checar estas aderências de regimes totalitários com o Opus Dei, vem a fatídica pergunta: Como Cammilleri não enxergou isto no próprio Opus Dei?

Eis um mistério a se resolver!!!

Ficamos com a impressão que mesmo com o livre debate, muitas pessoas continuarão a ter a mesma boa impressão do Opus Dei, por ficarem somente em aspectos mais superficiais.

Seria o remédio para estas pessoas deixar que “batam de cabeça” e vejam com os próprios olhos os bastidores da obra? Seria necessário que acontecesse uma coisa muito ruim para as pessoas acordarem? Mesmo que um super-numerário não seja afetado pelas mazelas do Opus Dei, seria necessário um sacrifício de um filh@, net@ ou sobrinh@ para que esta pessoa acordasse? Nesta última pergunta sabemos de 2 casos com finais completamente diferentes: caso 1) o pai super-numerário decidiu sair da obra após constatar erros no tratamento mental de seu filho numerário; caso 2) o pai super-numerário, de grande projeção profissional, até hoje não acordou e tem seu filho “alpistado”, abandonado num canto qualquer de um centro da obra e, finalmente, imprestável... "devolvido" para os pais. Omnia in bonum!.

Mr.M, AGO 2005